Publicada no JOUE, a Diretiva que regula as condições laborais do trabalho através das “plataformas digitais”
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SubscreverTrabalhar em plataformas digitais é uma realidade cada vez mais generalizada na União Europeia (UE), onde mais de 28 milhões de pessoas prestam serviços numa das 500 plataformas digitais existentes, de acordo com os dados do Conselho Europeu.
No entanto, até ao momento não existia qualquer regulamentação específica a nível harmonizado que garantisse determinadas condições de trabalho, uma proteção reforçada dos dados pessoais ou uma certa homogeneidade na prestação de serviços através deste modelo de negócio.
Para responder a estes desafios, foi aprovada e publicada a Diretiva (UE) 2024/2831 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de outubro de 2024 (a Diretiva), que entrará em vigor a 2 de dezembro de 2024 e cujo prazo para transposição pelos Estados-Membros expirará a 2 de dezembro de 2026.
Âmbito de aplicação objetivo e subjetivo
A Diretiva aplica-se a todos os trabalhadores que prestam serviços através de sistemas que a norma define como plataformas digitais, independentemente do sector, da natureza contratual e de a prestação de serviços ser efetuada diretamente ou através de um intermediário.
A norma europeia será aplicável a todas as plataformas digitais (website e aplicações no telemóvel), desde que o trabalho nas plataformas organizado através das mesmas seja realizado na UE, independentemente do seu local de estabelecimento e da legislação aplicável na forma definida pelo art. 2.º da Diretiva.
Novidades e obrigações introduzidas pela Diretiva
A Diretiva introduz novos direitos e obrigações, entre outros:
- Presunção de laboralidade se existirem indícios de controlo e direção por parte da plataforma, tendo em conta as eventuais consequências laborais, de segurança social, administrativas e fiscais derivadas de uma eventual reclassificação.
Até agora, em Espanha, esta presunção era exclusiva do trabalho em plataformas digitais de entrega ou de distribuição de qualquer produto de consumo ou mercadoria (Disposição Adicional 23.º do Texto Consolidado que aprova o Estatuto do Trabalhador -TRLET-, introduzida pela Lei 12/2021, de 28 de setembro).
Em Portugal, desde maio de 2023, existe uma presunção de laboralidade aplicável a qualquer plataforma digital (artigo 12.º-A do Código do Trabalho, “CT”). - Sistemas de responsabilidade solidária de plataformas e intermediários em caso de incumprimento de obrigações laborais e de segurança social.
- Direitos mínimos e melhoria das condições de trabalho:
- Direito à saúde e segurança no trabalho dos trabalhadores das plataformas, exigindo uma avaliação de riscos específicos, incluindo riscos psicossociais e ergonómicos e adotando medidas preventivas e de proteção adequadas.
- Direito à garantia de proteção perante um tratamento injusto ou desfavorável pelo exercício dos seus direitos, incluindo proteção contra despedimento ou medidas disciplinares (nas relações laborais) ou rescisão contratual (nas relações comerciais), estendendo-se essa proteção à “pessoa encarregada da supervisão de decisões automatizadas.”
Obrigações em matéria de transparência, equidade, supervisão humana, segurança e prestação de contas na gestão algorítmica:
- Duplo dever de informação que consiste em informar e consultar os representantes dos trabalhadores (ou, na sua ausência, os próprios trabalhadores) sobre a introdução de sistemas automatizados de supervisão ou de tomada de decisões ou sobre alterações substanciais na sua utilização, bem como fornecer informações muito detalhadas sobre a utilização de sistemas que afetem as condições de trabalho, a organização do trabalho ou a supervisão da sua execução.
Paralelamente, em Espanha, devem observados os deveres previstos no artigo 64.4.d) TRLET no que respeita à informação aos representantes dos trabalhadores sobre os parâmetros, regras e instruções em que se baseiam os algoritmos ou sistemas de inteligência artificial quando afetem a tomada de decisões e possam incidir nas condições de trabalho, no acesso e manutenção do emprego, incluindo a elaboração de perfis.
Em Portugal, também deverão ser cumpridas as obrigações estabelecidas nos artigos 106.º, n.º 3, alínea s), 424.º, n.º 1, alínea j) e 466.º, n.º 1, alínea d) do CT no que respeita à informação que deve ser prestada aos trabalhadores, à comissão de trabalhadores e aos delegados sindicais, no que diz respeito aos parâmetros, critérios, regras e instruções em que se baseiam os algoritmos ou sistemas de inteligência artificial que afetam a tomada de decisões sobre as condições de trabalho, bem como sobre o acesso e manutenção do emprego, incluindo a definição de perfis e o acompanhamento da atividade profissional dos trabalhadores.
Limitação do tratamento de dados pessoais, sendo proibido o tratamento de dados pessoais sensíveis através de sistemas automatizados de monitorização ou de tomada de decisão, tais como dados sobre estado emocional, conversas privadas ou dados biométricos para identificação múltipla.
- Duplo dever de informação que consiste em informar e consultar os representantes dos trabalhadores (ou, na sua ausência, os próprios trabalhadores) sobre a introdução de sistemas automatizados de supervisão ou de tomada de decisões ou sobre alterações substanciais na sua utilização, bem como fornecer informações muito detalhadas sobre a utilização de sistemas que afetem as condições de trabalho, a organização do trabalho ou a supervisão da sua execução.
- Obrigação de realizar uma avaliação de impacto quando o tratamento implicar um elevado risco para os direitos e liberdades dos trabalhadores.
- Supervisão humana e avaliações periódicas dos efeitos de cada uma das decisões adotadas ou apoiadas por sistemas de supervisão ou de tomada de decisão, bem como o direito à participação humana na revisão de tais decisões.
- Cooperação e intercâmbio de informações entre os Estados-Membros para garantir o cumprimento efetivo da Diretiva, especialmente em situações transfronteiriças, através da declaração dos trabalhos realizados.
- Promover a Negociação Coletiva: promoção do diálogo social e da participação efetiva dos representantes dos trabalhadores.
Em conclusão, a Diretiva representa um passo importante para adaptar o quadro normativo à realidade do trabalho nas plataformas digitais, mas também levanta novas questões e desafios que os Estados terão de enfrentar no seu contexto nacional, no prazo máximo de dois anos. Para tal, deverão também ter em conta as obrigações decorrentes do ordenamento jurídico-laboral de cada país (TRLET em Espanha e CT em Portugal) e da regulamentação europeia em matéria de proteção de dados (RGPD) e em matéria de inteligência artificial (RIA).
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