No passado dia 23 de fevereiro, a Comissão Europeia publicou a sua tão esperada proposta de Diretiva relativa ao dever de diligência das empresas em matéria de sustentabilidade (a "Proposta"), que tem como objetivo:
» Estabelecer uma norma europeia obrigatória de conduta empresarial para assegurar que as empresas cumprem o seu dever de respeitar os direitos humanos e o ambiente relativamente às suas próprias operações, às das suas filiais e a todas as suas cadeias de valor globais.
» Permitir que as empresas sejam consideradas responsáveis por danos resultantes de violações e abusos.
Na União Europeia (UE), há uma mudança da regulamentação voluntária (soft-law) para a regulamentação obrigatória (hard-law), através da adoção de normas jurídicas, que colocam novas obrigações e responsabilidades às empresas. É assim reconhecido que a luta contra as alterações climáticas e a preservação do ambiente, o respeito pelos direitos humanos e a boa governação não são apenas da responsabilidade dos Estados, mas que a atividade económica desempenha um papel muito importante.
Vários países europeus já dispõem de regras específicas de controlo e diligência corporativa relativamente aos efeitos da atividade da empresa ou da sua cadeia de abastecimento sobre os direitos humanos e o ambiente: entre outros, a Lei de Controlo Francesa de 2017 ou a Lei de Controlo da Cadeia de Abastecimento Alemã de 2021 (para mais informações aqui).
Em Espanha, o plano legislativo do Governo prevê uma iniciativa a este respeito e o Ministério dos Direitos Sociais e Agenda 2030 abriu recentemente um processo de consulta pública sobre um futuro "Projeto de Lei sobre a Proteção dos Direitos Humanos, Sustentabilidade e Diligência nas Empresas e Atividades Transnacionais" no qual as empresas e os cidadãos são convidados a participar publicamente enviando opiniões sobre esta próxima iniciativa legislativa.
Na UE, para além das obrigações de apresentação de relatórios impostas às empresas pela Diretiva sobre informação não financeira (2014/95/UE) (que está a ser alterada para melhorar a qualidade da informação que as empresas fornecem nos seus relatórios de sustentabilidade e introduzir normas homogéneas de prestação de contas), já existem algumas regras sectoriais que impõem obrigações de diligência às empresas nas cadeias de abastecimento, mas apenas em áreas específicas (Regulamento 995/2010/UE no setor da madeira e o Regulamento 2017/821/UE em relação a minerais provenientes de áreas de conflito ou de alto risco).
O Parlamento Europeu e o Conselho da UE tinham solicitado à Comissão que apresentasse uma proposta para um quadro jurídico da UE sobre governação empresarial sustentável (i) incluindo uma obrigação transsectorial de diligência ao longo das cadeias de valor globais e (ii) clarificando o dever dos administradores e gestores das empresas no cumprimento da diligência.
A Proposta deve ser lida como parte de um novo quadro político-legislativo da UE destinado a estabelecer deveres e obrigações concretas para as empresas em relação ao respeito pelos direitos humanos e pelo ambiente. Trata-se de um reconhecimento explícito pela UE da necessidade de ir além dos modelos de cumprimento voluntário e de responsabilização que têm governado o mercado global desde que o Conselho de Direitos Humanos da ONU aprovou os Princípios Orientadores sobre Empresas e Direitos Humanos em junho de 2011.
A importância desta iniciativa e o seu impacto nas empresas exige que nos mantenhamos atentos à sua evolução e às modificações que se espera venham a ser feitas no processo legislativo comunitário. Uma vez aprovada (o que estimamos que acontecerá em 2023), os Estados-membros terão de transpor a Diretiva, que se aplicará num prazo de dois anos para as empresas de maior dimensão (previsivelmente durante 2025).
Neste Legal Flash, a nossa equipa de conhecimento e inovação faz um resumo das principais questões presentes na Proposta.