Decisão TJUE: Obrigação de fornecer ou custear óculos ao trabalhador

2023-02-08T14:17:00
Portugal
Qual o impacto desta decisão em Portugal?
Decisão TJUE: Obrigação de fornecer ou custear óculos ao trabalhador
8 de fevereiro de 2023

Por Acórdão de 22.12.2022, proferido no âmbito do Processo C-392/21, na sequência de um pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Tribunal de Recurso de Cluj, Roménia, o Tribunal de Justiça da União Europeia (“TJUE”) decidiu que, sempre que o tipo de trabalho prestado por um trabalhador envolva a utilização de equipamentos dotados de visor, impenderá sobre o empregador uma obrigação de:

  • fornecer óculos graduados; ou
  • reembolsar o trabalhador pelas despesas efetuadas para corrigir e prevenir perturbações visuais - podendo os mencionados custos ser suportados por um sistema nacional de saúde nacional, se previsto.

A questão foi suscitada a propósito da interpretação dos números 3 e 4, do artigo 9.° da Diretiva 90/270/CEE do Conselho, de 29 de maio de 1990 relativa às prescrições mínimas de segurança e de saúde respeitantes ao trabalho com equipamentos dotados de visor (a “Diretiva”), após a Inspeção-Geral da Imigração da Roménia ter indeferido o pedido de reembolso das despesas relativas à aquisição de óculos apresentado por um trabalhador da referida entidade, que alegava uma “forte deterioração” da visão provocada pelo trabalho prestado em frente ao computador.

De acordo com a Diretiva, os trabalhadores devem:

     i.        Antes de o trabalho com visor ter início: usufruir de um exame adequado dos olhos e da vista, a efetuar por pessoa dotada das necessárias qualificações;

    ii.        Periodicamente: quando surjam perturbações visuais que possam ter resultado do trabalho com visores, beneficiar, caso seja necessário, de um exame médico oftalmológico, e, por consequência, de dispositivos de correção especiais, concebidos para o seu tipo de trabalho, custeados pelo empregador.

Restaria concretizar o conceito “dispositivos de correção especiais”, delimitar o espectro de utilização deste tipo de dispositivos, limitando-o à utilização profissional, ou, por outro lado, estendendo-o ao foro pessoal, e em que termos poderia esta necessidade ser suprida.

O TJUE entendeu que existirá a necessidade de o empregador fornecer ou custear dispositivos de correção especiais, incluindo-se nesta noção os óculos graduados, sempre que o tipo de trabalho prestado envolva a utilização de visores e surja ou se agrave uma perturbação visual daí decorrente, independentemente de o uso do trabalhador desse mesmo objeto não se cingir ao próprio local de trabalho.

O TJUE clarificou ainda não ser possível mitigar esses custos através de um aumento geral da remuneração devida ao trabalhador.

Qual o impacto desta decisão em Portugal?

Entre nós, a Diretiva relativa às prescrições mínimas de segurança e de saúde respeitantes ao trabalho com equipamentos dotados de visor já tinha sido transposta pelo Decreto-Lei n.º 349/93, de 1 de outubro. Este diploma estabelece as obrigações do empregador não só quanto à avaliação de postos de trabalho no que diz respeito aos riscos para a visão e tomada das respetivas medidas, como também quanto a vigilância médica e fornecimento de dispositivos especiais de correção concebidos para o tipo de trabalho desenvolvido, sempre que exigido pelos exames médicos.

Transpondo a Diretiva, também o diploma nacional em referência estabelece que, “sempre que os resultados dos exames médicos o exigirem e os dispositivos normais de correcção não puderem ser utilizados, devem ser facultados aos trabalhadores dispositivos especiais de correcção concebidos para o tipo de trabalho desenvolvido”.

O TJUE densificou este conceito de dispositivos especiais de correção, que claramente abarca óculos graduados.

De notar que, no âmbito de um processo de reenvio prejudicial, os acórdãos proferidos pelo TJUE vinculam não só o tribunal nacional em que a questão, inicialmente, foi suscitada, mas também todos os órgãos jurisdicionais dos outros Estados-Membros da União Europeia.

Assim, caso uma questão de teor idêntico se coloque em Portugal, o empregador ficará, sujeito às obrigações aqui expostas.

Para exigir o pagamento, os trabalhadores terão de demonstrar que, por via do trabalho que efetuam, precisam de óculos, lentes de contacto ou outro equipamento de correção específicos. Esta demonstração far-se-á através dos exames feitos nas consultas periódicas de medicina do trabalho, ou por via de uma decisão de atribuição de doença profissional.

8 de fevereiro de 2023