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SubscreverPor Acórdão de 28.11.2022, proferido no âmbito do Processo n.º 6337/21.8T8VNG.P1, o Tribunal da Relação do Porto (“Tribunal”) decidiu que o artigo 28.º da Lei da Proteção de Dados Pessoais[1], não exige que exista procedimento criminal para uso das imagens captadas através do sistema de videovigilância, sendo a ideia subjacente: os meios de videovigilância não podem ser utilizados com a finalidade de controlar o desempenho profissional do trabalhador, antes visando a proteção e segurança de pessoas e bens - pelo que poderão ser utilizados como meio de prova, no apuramento de responsabilidade disciplinar, se:
i. não estiver em causa o controlo do desempenho do trabalhador e
ii. caso os factos possam ter relevância criminal, independentemente de existir procedimento criminal.
A questão suscitada prendia-se com o facto de as imagens gravadas (recolhidas através do sistema CCTV) só poderem, alegadamente, ser utilizadas no âmbito de procedimento disciplinar na medida em que o fossem no âmbito do processo penal (citando o artigo 28.º, n.º 4 da Lei n.º 58/2019). Assim, o facto do empregador não ter apresentado queixa crime, poderia levar à conclusão que as imagens do sistema de videovigilância não poderiam ser consideradas para efeitos do procedimento disciplinar que conduziu ao despedimento da trabalhadora.
Sucede que, o Tribunal entendeu ser admissível a utilização das referidas imagens como meio de prova, pois as mesmas tinham por finalidade, única e exclusiva, a proteção e segurança de pessoas e bens e não o controlo do desempenho dos trabalhadores.
Mais sustentou o Tribunal a esse respeito que, sendo certo que o n.º 4 do artigo 28.º da Lei n.º 58/2019 dispõe que as imagens gravadas e outros dados pessoais registados através da utilização de sistemas de vídeo ou de outros meios tecnológicos de vigilância à distância, nos termos previstos no artigo 20.º do Código do Trabalho, só podem ser utilizados no âmbito do processo penal, o n.º 5 desse mesmo preceito acrescenta que, nos casos previstos no número anterior, as imagens gravadas e outros dados pessoais podem também ser utilizados para efeitos de apuramento de responsabilidade disciplinar, na medida em que o sejam no âmbito do processo penal.
Ora, entendeu o Tribunal que, não só a jurisprudência mais recente – ainda que anterior referida Lei n.º 58/2019 - já tinha vindo a admitir a videovigilância como meio de prova em procedimento disciplinar, como não parece que o artigo 28.º da Lei n.º 58/2019 exija que exista procedimento criminal, estando em causa o apuramento de responsabilidade disciplinar, bastando para o legislador que estejam em causa factos que pudessem ser averiguados no âmbito do processo penal.
Ou seja, a decisão em causa clarifica uma questão controversa ao reconhecer que:
- os meios de videovigilância não podem ser utilizados com a finalidade de controlar o desempenho profissional do trabalhador, antes visando a proteção e segurança de pessoas e bens; pelo que
- os meios de videovigilância poderão ser utilizados como meio de prova, no apuramento de responsabilidade disciplinar, se não estiver em causa o controlo do desempenho do trabalhador e os factos puderem ter relevância criminal, isto independentemente de existir, de facto, procedimento criminal.
Aquilo que está subjacente é a especial qualidade/gravidade dos factos imputados ao trabalhador e não a existência de processo no foro criminal, bastando que estejam em causa factos suscetíveis – ainda que abstractamente - de serem averiguados nesse âmbito.
Sendo assim, discutindo-se a eventual apropriação por parte da trabalhadora de um livro sem pagar o respetivo preço, o Tribunal conclui que não havia dúvidas sobre a possível relevância penal dos factos em apreciação, pelo que admitiu a utilização das imagens em causa como meio de prova no procedimento disciplinar, independentemente de o empregador ter decidido avançar com um procedimento criminal contra a trabalhadora.
[1] Lei n.º 58/2019, de 8 de agosto, que assegura a execução, na ordem jurídica nacional, do Regulamento (UE) 2016/679, do Parlamento e do Conselho, de 27 de Abril de 2016, relativo à protecção das pessoas singulares no que diz respeito ao tratamento de dados pessoais e à livre circulação desses dados (“RGPD”)
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